27.7.05

Dilema

A mais de 2.000 km de distância, vao-me chegando ecos da luta de bastidores que se desenrola no PSD-Porto com a elaboraçao da lista para o executivo camarário encabeçada por Rui Rio.

Questao centralizada numa só pessoa: Paulo Morais. Contra ele tem o aparelho mais obscuro, o dos grandes interesses, enfeudado ao lobby da construçao civil, já saturado com o desplante daquele em lhes dizer repetidamente Nao e ameaçando cortar financiamentos às campanhas, porventura também às dos concelhos limítrofes. Mas, curiosamente, Paulo Morais tem a seu favor o aparelho profundo, o mais basista, aquele que mais contacto tem no dia a dia com o cidadao comum e que, talvez por isso, melhor consegue aferir a real credibilidade dos vereadores junto do eleitorado.

Diga-se que Paulo Morais nao foi apenas o vereador mais influente e que mais marcou este mandato. Ele teve um papel decisivo no empurrao final a Rui Rio para se candidatar temerariamente contra Fernando Gomes, arriscando uma derrota entao considerada certa e esmagadora.

Durante este mandato, Rui Rio e Paulo Morais foram as duas faces de uma mesma moeda. Ninguém como PM soube seguir à risca o programa eleitoral entao definido, primeiro no pelouro da Habitaçao Social, depois no do Urbanismo, enfrentando todos e quaisquer interesses que se interpusessem, semeando ódios, mas ganhando com isso respeito e credibilidade. Sem um vice-presidente como PM, que soube, melhor que ninguém, executar uma estratégia com toda a convicçao e sem hesitaçoes, a Câmara do Porto nao conseguiria angariar metade do prestígio que hoje indiscutivelmente tem no país inteiro.

Rui Rio vê-se agora confrontado com um dilema. Por um lado, defronta-se com as pressoes do aparelho obscuro que a ele consegue aceder permanentemente e a quem PM defraudou de forma continuada, recusando sempre satisfazer os seus "empenhos". A sua argumentaçao é a costumeira de quem está ao serviço de interesses e grupos de pressao: o Partido corre o risco de ser ostracizado se continuar na senda do permanente conflito com as "forças vivas" da cidade. As "forças vivas" sao algo de muito nebuloso que vai do futebol aos construtores e aos ditos "agentes culturais", passando pela sempre temida imprensa. A caricatura que representa o cartaz do Bolhao, mais nao é do que uma primeira e ridícula cedência às "forças vivas". Mas, por outro lado, Rui Rio sabe que perderá em credibilidade se aceitar sacrificar Paulo Morais e ceder o pelouro do Urbanismo, que é verdadeiramente o que está em causa.

Rui Rio também sabe e espero que nesta altura se recorde, que tem hoje um peso eleitoral próprio, bem maior do que o do PSD e infinitamente superior ao de todas as figurinhas do aparelho, que conjuntamente valem pouco mais do que zero. Isto dá-lhe as condiçoes necessárias e suficientes para exigir carta branca na constituiçao da lista de vereadores e ignorar todo o ranger de dentes do aparelho que, embora contrafeito, estará sempre ao lado de quem tem força eleitoral.

Conheço Rui Rio há quase 30 anos e, se há faceta do seu carácter que me habituei a admirar e a respeitar ao longo deste tempo, é a sua extrema seriedade e integridade e a luta tenaz e frontal que sempre desenvolveu contra interesses de grupos que só subsistem de forma parasitária à custa de quase todos. Perante muitos, a sua postura e actuaçao assumiam foros de irracionalidade, de autênticos tiros no pé. No curto prazo, teve vários amargos de boca, no final a sua credibilidade e prestígio sairam sempre intocadas e em crescendo. Exemplos? A refiliaçao partidária quando foi secretário-geral do PSD, o folhetim do Plano de Pormenor das Antas, a política nos bairros sociais, esta numa perfeita parceria com Paulo Morais.

Por isso acredito que, mais uma vez, Rui Rio nao cederá aos interesses instalados e aos seus "amigos e conselheiros" do Partido.