26.11.06

A esfera pública


Por onde quer que os ingleses tenham colonizado, eles deixaram bens, ideias e instituições públicas: a ideia de democracia, a atitude constitucional, a respeitabilidade do Estado, as instituições da sociedade anónima e da bolsa de valores e várias outras. Foi assim nos EUA, no Canadá, na Austrália, na Nova Zelândia, até na India.###

Pelo contrário, por onde os portugueses (e os espanhóis) colonizaram, nenhuma instituição pública respeitável ficou de pé, menos ainda qualquer ideia. Ficaram apenas a língua e a Igreja Católica. Basta olhar a América Latina. Basta olhar as mais recentes heranças da colonização portuguesa: Angola, Moçambique, Cabo Verde, a Guiné e Timor possuem hoje a dúbia distinção de se encontrarem entre os vinte países mais pobres do mundo.

A diferença reside numa visão distinta da esfera pública da sociedade. Num caso, a esfera pública da sociedade - no sentido dos bens públicos, das instituições públicas e das ideias que as suportam - é vista como um capital precioso que deve ser preservado e aumentado para promover a melhoria de vida das pessoas no presente e para o futuro. No outro caso, a esfera pública da sociedade é vista como um conjunto de bens destinado a consumo imediato e a ser repartido imediatamente.

Nos países onde prevalece a primeira concepção, a discussão política tende a centrar-se nas formas de preservar e aumentar o capital público para benefício indeterminado da geração presente e das gerações futuras. Quando estes países deixam de colonizar, eles deixam também um legado nas suas ex-colónias - um legado de bens públicos, de instituições públicas e de ideias que suportam essas instituições.

Pelo contrário, nos países onde prevalece a segunda concepção, a discussão política tende a centrar-se na forma de distribuir os bens que pertencem à esfera pública entre os vários grupos de interesses que, entretanto, se organizaram expressamente para o efeito. Quando estes países abandonam as colónias, a esfera pública dos países colonizados fica fazia - os bens públicos, se alguns ainda existem ou se alguma vez foram criados, encontram-se delapidados e, quanto às instituições públicas e às ideias que as suportam, isso são coisas que, em primeiro lugar, nunca interessaram aos colonizadores.