25.3.07

liberdade de expressão


Nos países de tradição protestante, a liberdade de expressão é um meio para chegar à verdade. Não surpreende, por isso, que os maiores defensores modernos da liberdade de expressão fossem autores desta tradição, como John Stuart Mill e outros. Pelo contrário, nos países de tradição católica o meio para chegar à verdade é a autoridade, não a liberdade de expressão.###
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Nos países protestantes, cada homem, na procura da verdade, é levado a ler, a estudar, a ouvir, a reflectir, a participar em conferências, seminários, reuniões, a frequentar bibliotecas, de maneira a formar e a fundamentar a sua opinião - uma opinião que ele, depois, é livre de exprimir, visando o seu bem e o bem da comunidade. Nos países católicos, pelo contrário, quando privados da autoridade, os cidadãos ficam sem opinião. Eles nunca estiveram habituados a formar opinião, muito menos ao esforço de a fundamentar pela leitura, pelo estudo e pela reflexão - porque isso é algo que eles sempre se habituaram a que fosse a autoridade a fazer para eles.
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O resultado é que, num país católico, a liberdade de expressão não serve, em geral, nenhum fim benigno específico e é, muito frequentemente, utilizada para fins malignos, como o de diminuir ou insultar o próximo, denegri-lo ou até ameaçá-lo. Não estando habituado a formar opinião, menos ainda a fundamentá-la, o homem da tradição católica - ao contrário do homem da tradição protestante - não retira, em geral, qualquer benefício da discussão livre e pública das ideias.
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A liberdade de expressão é útil como instituição social quando cada homem possui uma tese ou opinião devidamente fundamentada e consegue persuadir os outros da bondade da sua opinião. Ela perde todo o seu valor social, quando a esmagadora maioria dos participantes não possui uma tese ou opinião - ou, se a possui, não fez o adequado trabalho de casa para a fundamentar.
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O debate público das ideias torna-se então uma enorme algazarra, onde cada um diz aquilo que lhe vem ao espírito - ideias sem fundamento, quando não verdadeiras tolices, graçolas, piadas, insultos e impropérios - e onde a voz daqueles poucos que possuem opiniões fundamentadas sobre os assuntos da vida é submergida pelo barulho da multidão. O benefício social da discussão pública e livre das ideias torna-se então praticamente igual a zero.
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Uma das razões, talvez a principal, que me levou a participar na blogosfera foi a curiosidade de avaliar o estado da opinião pública em Portugal - opinião pública da qual depende a viabilidade da democracia. Eu tinha uma experiência de mais de dez anos nos jornais, na rádio e na televisão, mas aí os efeitos de feed-back são escassos, senão mesmo, na maioria dos casos, inexistentes. Pelo contrário, a blogosfera e o Blasfémias, em particular, ofereciam a possibilidade de feed-back directo, imediato e plenamente livre.
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Ao final de seis meses, a minha avaliação é algo decepcionante. Para além do Euroliberal, da zazie, do anti-comuna, do HO, do CN, não são muitos mais os comentadores habituais deste blogue que conseguem ter uma opinião ou uma tese sobre os assuntos da vida, e menos ainda aqueles que se deram ao trabalho de a fundamentar.